8 de jan. de 2012

As Confissões de Schmidt - About Schmidt (Alexander Payne - 2002) (Com Spoilers)



Seguindo o meu atual vício pela filmografia do Jack Nicholson, resolvi assistir à "As Confissões de Schmidt". O filme está oficialmente classificado como um híbrido de comédia/drama, e creio que está bem posicionado entre esses dois gêneros, realmente. O tom do filme é dramático, mas não é pesado, a trilha sonora é muito agradável (e a theme song do personagem é, se me permitem dizer, muito bonitinha), mas há também os seus momentos engraçados. Vamos à sinopse:


Warren Schmidt é um recém aposentado de uma empresa de seguros, onde trabalhou a vida inteira, casado há 42 anos com a mesma mulher com quem tem uma filha; Jeannie (Hope Davis)...um americano supostamente comum. Ele poderia muito bem levar uma vida típica de americano aposentado, viver das economias provindas de uma vida inteira de trabalho, sair para viajar com sua esposa no moderno trailer que acabaram de comprar, um espaçoso Adventurer. Mas, se fosse assim, não teríamos um filme e tampouco um atuação tão comovente do Sr. Nicholson.
Depois de se sentir bastante inútil em seus primeiros dias como aposentado, Warren assistindo à TV, vê um anúncio sobre crianças órfãs da África, e resolve "adotar" uma delas, essa adoção se baseia em mandar uma mesada mensal para a criança. Schmidt, movido por um desejo interno de fazer a diferença (não tanto por verdadeiro altruísmo, mais por poder se sentir melhor com o ato, creio eu), ele acaba ligando para a companhia e adotando um garotinho da Tanzânia, chamado Ndugu Umbu. O pessoal do anúncio pede para que, junto com o dinheiro, ele mande uma carta para Ndugu, para poder criar uma relação, já que eles não se conhecem. Começa assim, o grande número de cartas que Warren manda para o garotinho, contando detalhes de sua própria vida...é como se Ndugu fosse um confidente a quem ele pudesse contar todos os seus pensamentos, dos mais banais até às questões mais problemáticas de sua vida, e isso acaba proporcionando uma sessão de auto-conhecimento que mais tarde será muito importante para o personagem. Apesar de nunca aparecer durante o filme, Ndugu é um dos personagens mais vitais de toda a história.
O conflito da história começa quando, num dia aparentemente normal, a esposa de Warren, Helen Schmidt (June Squibb), morre repentinamente, devido a um coágulo no cérebro. É esse acontecimento que desencadeia uma profunda mudança na vida de Schmidt. Após todo o choque da notícia e a dor do velório, nos deparamos com uma situação um tanto engraçada: um homem que foi paparicado praticamente a vida toda por sua esposa tendo que se virar sozinho. O resultado é uma casa em completo caos, mas não apenas louça suja e restos de comida pelo chão, o caos também está em Walter, ele se vê, pela primeira vez na vida, completamente sozinho, e tendo que ser um sujeito ativo em todas as áreas de sua vida.


Sua filha, Jeannie, e seu noivo Randall (Dermot Mulroney), vêm de Denver para dar um suporte ao pobre viúvo. É quando descobrimos a frágil relação que há entre pai e filha, eles se amam, mas há um abismo muito grande separando os dois, isso foi provavelmente causado pela constante ausência de Warren ao longo da vida de Jeannie. Um típico caso de pai trabalhador-ausente. Além disso, Jeannie é uma workaholic, então sobra menos tempo ainda para reavivar a relação dos dois.  É importante ressaltar, também, que Warren detesta seu futuro genro, que é um mero vendedor de colchões, com um penteado mais estranho do que sua personalidade, e uma família mais estranha ainda, diga-se de passagem.
Depois de descobrir, recordando os pertences da esposa, que ela teve um caso muito antigo com seu melhor amigo Ray (essa cena também é muito engraçada, Warren passa instantaneamente de um estado saudoso para um de raiva extrema, ao jogar todas as queridas coisas de sua mulher no lixo), ele decide pegar seu Adventurer super equipado e embarcar em uma viagem até Denver, unir o útil ao agradável, visitar a filha e ao mesmo tempo convencê-la a desistir de seu casamento com Randall.
Ele tenta fazer uma surpresa para a filha, chegando alguns dias antes do combinado para o casamento, mas ela acaba literalmente "cortando o barato" dele, e dizendo para ele vir somente na data combinada, já que ela tem muito trabalho a fazer e não teria tempo para assisti-lo. Logicamente, ele fica bastante chateado com toda a situação, mas não desiste de seu propósito...ao invés de simplesmente dar meia-volta e continuar a vegetar dentro de sua casa caótica, ele resolve dar um passeio por vários locais de seu passado, que sempre quis revisitar, mas por discordância de sua mulher, não pôde.


Aí começa uma série de episódios tragicômicos envolvendo a viagem de auto-conhecimento de Schmidt. Primeiramente, ele visita a casa onde nasceu, a qual, numa cena de doída nostalgia, foi destruída e no local construída uma loja de pneus. A segunda parada é o campus da universidade onde estudou. Mais tarde, ele passa a noite em um acampamento de trailers (creio eu), e acaba conhecendo um casal muito simpático de Winsconsin, depois de um jantar e muita conversa, o marido sai para comprar mais bebidas, e Schmidt fica conversando com a mulher, ela lhe diz que possui uma intuição aguçada em relação ao interior das pessoas, e que ao olhar para Warren, ela vê alguém que tem uma posição otimista e positiva externamente, mas que no fundo é muito triste. E ele lhe responde dizendo que apesar de só a conhecer há algumas horas, ela o entende melhor do que sua mulher jamais entendeu, em 42 anos de casamento, e ao dizer isso, passa para o próximo nível e a beija. A mulher vê aquilo como a maior bizarrice do mundo e manda Warren embora a gritos e pontapés. Ele sai do acampamento muito envergonhado e pisando fundo em seu Adventurer.
Em meio a todos esses acontecimentos, as cartas confessionais para Ndugu continuam, e é desse modo que conseguimos ver como Schmidt se sente. Mais tarde, ele chega em Denver e se hospeda na casa da família de seu futuro genro, onde fica bem assustado com as relações estranhas entre os membros do clã. Não conseguindo demover Jeannie do casamento, ele acaba se rendendo à ideia, e dá um belo discurso no dia da cerimônia.
Ao voltar para casa, ele percebe novamente que está sozinho e que não tem ninguém. E o mais importante: começa a passar por uma grande crise existencial...que diferença eu faço no mundo? que diferença eu faço na vida das pessoas? que diferença eu sempre fiz? com a aparente resposta, ele se sente cada vez mais frio e vazio. É nesse momento que chega uma carta decisiva da África, ela é escrita por uma freira que toma conta de algumas das crianças da Tanzânia, incluindo Ndugu, ela escreve porque quer dizer a Schmidt que Ndugu recebeu todas as cartas que ele lhe escreveu e quer lhe mandar um desenho. Anexo à carta, Warren encontra o desenho: um simples rabisco de uma criança de aproximadamente 6 anos, mas que significa o mundo para ele, os rabiscos representam Ndugu e Warren sob um dia ensolarado, de mãos dadas. Assim, Schmidt percebe que fez, sim, diferença na vida de outro ser humano, por mais que seja alguém que ele nunca viu na vida e provavelmente nunca verá.
Essa é talvez a cena mais bela de todo o filme, e nem preciso comentar que Jack Nicholson está maravilhoso, se não fosse por ele, o significado transmitido não seria o mesmo. Não é a toa que ele ganhou o Globo de Ouro pela performance (mas, na minha opinião, merecia certo um Oscar).  

                                          
Encerro por aqui meu post, dizendo que As Confissões de Schmidt é um filme muito sensível, que fala basicamente sobre auto-conhecimento, mostrando que este pode acontecer em qualquer época da vida. Nesse caso, é Warren quem se depara com questões puramente existenciais em uma época da vida que imaginou que seria só calmaria e descanso. Fala de um homem que se vê, de repente, confrontado por sua própria história, questionado sobre o sentido de sua vida, e ele vai em busca desse sentido, por mais que seja uma busca insólita, sem saber o que vai encontrar no final da estrada. No final, ele encontra o sentido, e portanto, o descanso, no elemento em que menos esperava encontrar sentido. Finalizando, recomendo muito esse filme.


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